Vozes do Além
Era noite fria de fevereiro. Uma terça-feira gorda, em que dava para ouvir na cidade inteira a orquestra tocando marchinhas no Bancrévea. Norberto não poderia ir à festa naquela noite, embora o Caetano o tivesse chamado para ser o operador do Fantástico Bailar Bi-canal, aparelhagem que tocaria naquele baile. As ruas em volta do prédio Lucídio Paes estavam desertas. Nenhuma viva alma passava por ali, naquelas horas domínio de ratos e morcegos, que circulavam livres hipnotizados pelo odor de gordura e sangue fresco vindos do mercado de carne. Um cheiro de maresia soprado por uma brisa suave subia do rio em direção à terra firme. Acolá o seu Contente lia um pouco à luz de um aladim brilhante. Mais adiante, sob uma marquise na penumbra, um casal tramava o amor às escondidas. No café do Guilherme armado em palafita dois gatos pingados e embriagados discutiam política em cima das águas escuras do rio. No bar do Nicola era noite de reunião da Sociedade Freudiana, e era possível a