CHEIRO DE DEFUNTO
(Do livro Deolinda e outros fantasmas amazônicos ) Trafegar por aqueles caminhos enlameados rasgados no meio da floresta densa, percorrendo o que só com muito otimismo se poderia chamar de uma estrada, era o trabalho extenuante dos dois. Motorista e cobrador viajavam em um ônibus bem cuidado, limpo, com manutenção em dia e cortinas azuis nas janelas, mas estavam abandonados à própria sorte quando saiam, ainda de madrugada, para as demoradas viagens que faziam todo dia, às vezes ficando pelo meio do caminho; em outras simplesmente dormindo dentro do ônibus em alguma beira de estrada, ouvindo os seres da noite que zoavam da capoeira, porque não haveria tempo para retornar à garagem e iniciar outra jornada no dia seguinte. No inverno as coisas pioravam. Caminhos poeirentos tornavam-se uma sequência interminável de atoleiros, por onde o carro chafurdava. À noite, fatigados, ainda precisavam remover a lama que emporcalhava tudo, no interminável entrar e sair dos passageiros. Naquela tarde